Texto: Rogério Romero

Precoce. Este talvez seja o adjetivo que mais resume a carreira de Ricardo Prado. Natural de Andradina, o caçula de 5 filhos de uma família de esportistas nasceu em 3 de janeiro de 1965. Com 5 anos já fazia parte da equipe de natação. Aos 6 anos disputou o primeiro Campeonato Brasileiro Infantil. Foi campeão brasileiro pela primeira vez aos sete anos de idade, nos 50 metros borboleta.

Em 1977, com apenas 12 anos de idade, fez parte da seleção brasileira que foi ao Peru disputar o campeonato sul-americano de natação.

Com 13 anos, teve seu primeiro contato com o renomado treinador Mark Schubert, que estava com parte da sua equipe em São Paulo. Com ajuda, acabou entregando uma carta pedindo para treinar na equipe de Mission Viejo. Schubert pediu paciência ao jovem nadador para que aguardasse ao menos fazer 15 anos.

Desde cedo, Pradinho se destacou por ser muito técnico.

Em 1979, fez parte da seleção que participou dos Jogos Pan-americanos de San Juan, pegando final nos 200 e 400m medley.

Enfim com 15 anos e dois meses, em 7 de março de 1980, pagando 300 dólares mensais para a “família” americana e mais todas as outras despesas de treinamento em competição, ele foi para Los Angeles, sem falar inglês ou conhecer alguém. Treinando ao lado do dos recordistas mundiais dos 200 e 400m medley, Bill Barret e Jesse Vassalo, respectivamente, em apenas um mês abaixou cerca de 5s e fez o índice olímpico na prova que daria seus melhores resultados, os 400m medley, com 4:30.97 no campeonato americano.

Em sua estreia olímpica em Moscou ficou em 11º nos 400m medley, fazendo praticamente o mesmo tempo do seu índice olímpico com 4:31.69. Para se ter uma noção, nos últimos 10 anos, apenas um brasileiro de 15 anos nadou mais rápido que o tempo realizado a 39 anos! Nadou ainda os 100m costas, com 1:01.03. Na capital russa que percebeu que, apesar da sua baixa estatura (1m68), teria condições reais de ser o melhor do mundo.

Compensou isto com muito treino e técnica. “Ele trabalhava duro. Era um garoto pequeno, mas tinha um coração maior do que qualquer um. Treinou muito, decidiu que seria o recordista e conseguiu. Tenho muito respeito por ele“, declarou Schubert.[1]

Em 1981 começou a escrever seu nome nos livros de recordes, tirando do também versátil Djan Madruga 4 recordes nacionais, nos 200m costas, 200m borboleta e nos 200 e 400m medley, que seriam sul-americanos também. Nos 200m borboleta, foi o primeiro brasileiro a deter o recorde continental.

A consagração veio do 4º. Mundial da FINA, em Guayaquil, no Equador, com o ouro e recorde mundial nos 400m medley, em 4:19.78, abaixando 27 centésimos do seu agora rival Vassalo. As condições em que a equipe brasileira ficou provavelmente limitaram seus resultados nas demais provas, 200 borboleta, costas e medley, tanto que ele mesmo esperava uma marca ainda mais expressiva na que acabou se sagrando o primeiro campeão mundial brasileiro.

Reveja a prova do recorde mundial com comentários do próprio.

O Mundial de 1982 não teve grande cobertura.

De uma hora para outra, a grande imprensa reconheceu os feitos e Pradinho estava em todos os lugares. Se por um lado isto auxiliou na sua confirmação como ídolo de uma geração, por outro trouxe para o jovem atleta uma cobrança imensa pelo ouro olímpico.

 

De volta aos Estados Unidos, Pradinho aceitou o convite para treinar e estudar Economia na Southern Methodist University, onde alcançou grandes resultados no NCAA, novamente fazendo história ao ser o primeiro brasileiro a conquistar o ouro no disputadíssimo campeonato universitário americano. Não apenas isso, dentro dos seus 5 ouros nos 4 anos que competiu, foi tricampeão nas 400 jardas medley (83, 84 e 86). Esta passagem lhe rendeu uma homenagem em 2017 pelo nosso similar da SMU, no Athletics Hall of Fame.

Clique aqui para ver a cerimônia, onde Prado fala aos 51:36.

Em 1983, antes de uma participação histórica no Pan, ele encarou as Universíades em Edmonton, Canadá, onde viu a ascensão do local Alex Baumann, que levou as duas provas de medley com recorde de campeonato, sendo os 400 com recorde da comunidade britânica, ficando a apenas 2 centésimos do recorde mundial do brasileiro. Prado ficou com o bronze nas duas provas, as únicas do Brasil na Natação, e ainda finalista nos 200m borboleta e costas.

Pouco mais de um mês depois, ele estava em Caracas com a seleção nacional, disputando seu segundo Jogos Pan Americanos, onde a equipe americana foi com sua melhor delegação, quebrando 3 recordes mundiais.

Agora Prado era a cara da Natação Brasileira

Saiu como o maior medalhista individual da competição, vencendo os 200 e 400m medley e batendo os recordes continentais nos 200m costas e borboleta, sagrando-se vice-campeão em ambas.

Já com a mídia passando ao vivo, as medalhas do Pan alavancaram a expectativa olímpica e consagrando-o como uma das grandes esperanças brasileiras para o ano seguinte.


Pré Los Angeles, a exposição foi ao máximo.

E finalmente chega o ano olímpico. Após ter seu recorde ameaçado no ano anterior, viu o alemão oriental Jens-Peter Berndt abaixar a marca mundial para 4:19.61 em maio. Menos de um mês depois, na seletiva canadense, Alex Baumann abaixou quase 2s, trazendo o recorde para 4:17.53. Berndt acabou não indo para Los Angeles por conta do boicote, mas Prado teria que encarar o canadense em 17 de junho.

Um reencontro entre os dois gigantes da água

O brasileiro fez sua prova e passou na frente nos 200m, sendo ultrapassado no peito e não conseguiu tirar a vantagem nos 100m finais. Novo recorde mundial para Baumann, tirando 8 centésimos do seu recente recorde, e nova marca sul-ameriana para Ricardo Prado. Com seus 4:18.45, demonstrou que nunca treinou para ficar em segundo. Sua marca que só viria a ser batida 20 anos depois, por outro futuro medalhista olímpico da prova, Thiago Pereira.

“Foi difícil, mas valeu. Faria tudo de novo. Tirei muito mais da natação do que dei. E, de mais a mais, tudo tem o seu preço. O meu foi apenas alto”.[2]

Acabou ainda em 4º. nos 200m costas mas ficou de fora das finais dos 200m medley e borboleta, onde finalizou na 17ª. posição.

Prado ainda teve um bom desempenho nos próximos 3 anos, ganhando a primeira edição do Pan Pacífico e também a Universíade, quebrando a barreira dos 4:20 mais uma vez nesta.

Pegou final no Mundial de Madri em 1986 nos 200m medley e, quando todos já pensavam que se aposentaria, voltou para seu terceiro Pan, conquistou mais 3 medalhas, prata nos 200m costas e bronze nos 200m medley e no revezamento 4×100 medley.

Precoce também foi o fim da sua carreira. Com apenas 23 anos, mas com uma bagagem de fazer inveja, encerrou os treinamentos após ter sido diagnosticado por hepatite no início de mais um ano olímpico.

Agora, com mestrado em Economia e formado também em Educação Física, sua contribuição é através de comentários, passando como treinador, gestor e palestrante. Teve um documentário contando sua história.

Assustou a todos aos 38 anos de idade, sofrendo um precoce infarto.

Pela sua bela carreira, com recorde e ouro mundial, prata olímpica, permeados por muita dedicação e técnica, reconhecemos Ricardo Prado no Hall da Fama da Natação Brasileira.

[1] https://www.uol.com.br/esporte/natacao/ultimas/2009/07/30/ult77u2505.jhtm

[2] https://web.archive.org/web/20121122080719/http://veja.abril.com.br/olimpiadas/2012/brasileiros-na-historia/12-ricardo-prado.shtml